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Risco de leptospirose é elevado em 34 bairros de Salvador

Na sua casa, no Pau da Lima, um prato de feijão e arroz esperava por Edson Dias, 41 anos, mas ele sequer saboreou o almoço de ontem. Bastou um minuto de vacilo e uma ratazana passou sobre a comida.

Isso é revirar o estômago, não é? Pois a presença do animal não é rara em Salvador. Em Pau da Lima, 90% dos roedores são vetores da bactéria que causa a leptospirose, segundo pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

E o próprio Edson já foi vítima da doença, no ano passado. “Pensei que eu ia morrer. O que mais tem é rato, a qualquer hora”, queixa-se. Desde dezembro, o bairro onde ele mora é uma das localidades que fazem parte de 5  dos 12 distritos sanitários de Salvador com alto índice de transmissão de leptospirose, segundo o Centro de Controle de Zoonoses (CCZ).


No Uruguai, que fica em outro dos cinco distritos - o de Itapagipe -, a guerra contra os ratos é rotina, segundo a comerciante Carla Fabiana Silva, 31 anos. “Eu falo sempre: mijo de rato mata. Aqui, a gente vigia para não entrar em casa”. Em frente ao mercadinho dela, um beco abriga as ratazanas, que circulam livremente.

O risco de alguém contrair a doença também é maior nos distritos de Cabula/Beiru, São Caetano/Valéria e Subúrbio Ferroviário, segundo a coordenadora do programa de controle de roedores do CCZ, Maria Gorete Rodrigues: “O índice de infestação é considerado muito alto a partir de 25%. O baixo, que é ideal, fica em torno de 1%”.

Índice

Para chegar a esse número, equipes do CCZ visitam, a cada seis meses, os bairros em que houve casos confirmados de leptospirose. Daí, entrevistam a população e identificam o quanto o número de casos aumentou ou diminuiu desde a última visita. “Nós fazemos o cálculo proporcional”, diz o biólogo do CCZ Paulo Oliveira.

Com isso, os agentes de endemias começam o trabalho - que vai do uso de raticidas até palestras de prevenção. Mas o problema é que, nesses cinco distritos, o índice nunca chegou a ser a baixo.

“No máximo, conseguimos reduzir ao risco médio, porque são áreas sem saneamento básico. Se revertêssemos isso, reduziríamos a infestação. O veneno é paliativo”, observa Maria Gorete Rodrigues.

Diferentemente do mosquito da dengue, que busca água limpa e parada, os ratos preferem esse tipo de ambiente, segundo Paulo Oliveira. “Ratos se identificam com locais que tenham esgoto a céu aberto, acúmulo de lixo e entulho. É mais perigoso na época de chuva, com enchentes e alagamento”.

De acordo com a presidente da Limpurb, Kátia Alves, a coleta de lixo é feita diariamente nessas áreas infestadas - nas vias principais, chega a ser feita três vezes por dia, diz ela. O fato é que, só no ano passado, 14 pessoas morreram por conta da leptospirose em Salvador, de acordo a Secretaria da Saúde do Estado  (Sesab). Foram 209 casos notificados e 121 confirmados. Este ano, já foram 18 notificações pela Sesab na capital.

Já a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) diz que 32 casos foram notificados este ano, com 14 confirmações. Se comparado ao mesmo período de 2013, o aumento de notificações foi de 33%, enquanto o de casos confirmados, 10%.

Mesmo em áreas sem alto índice de transmissão da leptospirose, os moradores sofrem com os roedores. É o caso dois bairros do Nordeste de Amaralina, Santa Cruz, Chapada do Rio Vermelho e Vale das Pedrinhas (Distrito Sanitário Barra-Rio Vermelho).

Mobilização

Em frente ao posto de saúde do Vale das Pedrinhas, um canal parece um criatório. “Tem dia de sair daí 40 ratos. Tem até um cachorro que caça”, disse o carreiro Luiz Lopes, 33. Lá, agentes comunitários de saúde fizeram um abaixo-assinado pedindo a presença contínua do Serviço de Combate de Roedores. “Nós vamos às casas e o trabalho é interrompido por queixas por causa dos ratos”, conta Juarez Filho, que trabalha no combate à dengue.

Há dois anos, o pedreiro Renivaldo Nascimento da Luz, de 40 anos, escapou por pouco da leptospirose. “Eu saí para comprar pão e estava chovendo. Passei a perna em um lugar cheio de lixo. Quando cheguei em casa, estava com o corpo mole e febre. Levantei para ir ao banheiro e caí”, conta ele, que mora na Santa Cruz.

Até ser diagnosticado, Renivaldo pasou por dois postos de saúde. Depois, as notícias não foram animadoras: “O médico disse que eu tava morrendo”. Hoje, ele ainda faz exames e sente dores.
Também morador da Santa Cruz, o carpinteiro Edson Neves diz que a falta de educação agrava o problema. “Se a gente não jogasse lixo em todo lugar, diminuía”.

Para prevenir, é importante não deixar lixo ou entulho acumulado, segundo o biólogo e pesquisador da Fiocruz Federico Costa. Além disso, se você souber que vai ter contato com áreas alagadas ou esgoto, é bom usar luvas e botas para prevenir.