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Maior epidemia de dengue da história da cidade leva pânico a Catanduva (SP)

Os primeiros sintomas foram frio e dores em todo o corpo. A auxiliar de produção Joyce Fernandes, 22,  procurou a rede municipal de saúde e, assim como as outras 11.162 pessoas que fizeram o mesmo caminho, recebeu soro e foi liberada. Como o mal-estar não diminuiu, dois dias depois foi levada pela família a um hospital público, onde ficou três dias, segundo a família, em uma maca na enfermaria à espera de uma vaga na UTI (Unidade de Tratamento Intensivo). Quando a transferência aconteceu, cinco dias depois do primeiro diagnóstico, já era tarde. Ela morreu no mesmo dia. A direção do hospital foi procurada, mas não deu declarações sobre o caso até o fechamento desta reportagem.

Joyce não terminaria a reforma da casa onde ela vivia com a filha, Beatriz, 7, e o marido, o tipógrafo José Ricardo da Cruz, 26, no bairro Jardim Alpino, na periferia de Catanduva (385 km de São Paulo). No dia 10 de março, a dengue acabou com o sonho da família. "Ela mal conseguia se levantar e, depois de algum tempo, já nem respondia mais às perguntas que fazíamos a ela", conta a cunhada, Edilaine Aparecida da Cruz, 23, que mora numa casa construída no mesmo terreno onde Joyce morava.

Catanduva, na região de São José do Rio Preto, sofre com a pior epidemia de dengue de sua história e desde o final do ano passado concentra o maior número de mortes pela doença no país. Dos 57 óbitos registrados pelo Ministério da Saúde até agora, 15 (ou 29%) aconteceram na cidade de cerca de 118 mil habitantes. Há ainda 19 mortes sob investigação.

Ao todo, 9.466 casos de dengue foram confirmados, segundo números da prefeitura divulgados na sexta (20) . Nem a instalação de um hospital de campanha, de um laboratório e de uma ala para hidratação de doentes na Unidade de Pronto Atendimento conseguiram frear a epidemia na pequena cidade.

Em Catanduva, raro é encontrar quem não conheça alguém que tenha sido infectado. A cada grupo de 12 moradores, pelo menos um foi atingido pela doença, que pode ser ainda mais assustadora para quem já enfrenta algum problema de saúde ou debilidade.

Medo de morrer

A vendedora Elisângela Cristina Rodrigues Lopes, 23, era amiga de Joyce e, assim como a auxiliar de produção, sofre de anemia congênita. Nos últimos 60 dias, ela foi infectada pela dengue duas vezes.

"Chorei muito de medo de acontecer a mesma coisa comigo. Meu filho também sofre muito, porque acha que vai perder a mãe. Minha família está muito preocupada. Meu pai me liga toda hora para saber como estou", disse.

Na última quarta-feira (18), Elisângela aguardava atendimento de rotina na Unidade de Tratamento de Dengue, um hospital que a prefeitura improvisou no prédio onde funcionava uma escola particular. Desde que foi inaugurado em meados de fevereiro, o local recebe em média 250 doentes por dia.

Um deles era o leiturista William Tesouro, 29, que estava lá na quarta-feira (18). Ele pegou dengue pela primeira vez. "A febre e a dor eram tão intensas que pensei que fosse morrer. Parecia que tinha uma faca atravessada na minha cabeça", descreveu. "Não conseguia me alimentar, sentia um gosto amargo na boca. Não estou completamente bom ainda. Tenho sempre a sensação de que estou grogue."

Doença devastadora

Iraci, 72, que vivia com o irmão viúvo em uma casa humilde na Vila Guzzo, viu a dengue devastar a
saúde do aposentado Valdomiro Coutinho, 68. Ela lembra dele como uma pessoas agitada, que não gostava de adiar tarefas, que frequentava muito a igreja e trabalhava como obreiro. Mas em 15 dias o homem saudável foi derrubado por fortes dores de cabeça, ausência de apetite, diarreia e vômito. Passou a usar fralda.

Uma semana antes de morrer, o idoso foi encontrado duas vezes caído no quarto, sem forças para se levantar, e já não se comunicava mais com os parentes. "Ele parecia abobado, grogue", relata o sobrinho José Francisco da Silva Junior, 49.

A doença continua por perto, assombrando, diz Junior. A neta de Coutinho, Maria Júlia Aguiar da Silva, 9, também ficou doente, com sintomas mais leves, e na igreja que a família frequenta, pelo oito pessoas ficaram doentes.

Combate ao mosquito

Procurada, a Prefeitura de Catanduva informou que o número de doentes vem diminuindo, o que seria um sinal de que o combate ao mosquito transmissor, o Aedes aegypti, está surtindo resultados. Entre as ações oficiais contra o inseto estão a limpeza de terrenos, com o envio das despesas aos donos, entrada forçada em residências fechadas para destruição de criadouros e nebulizações com veneno.

Ainda segundo a prefeitura, os 15 óbitos registrados por dengue são, em sua maioria, de pessoas idosas que já apresentavam problemas de saúde.

O Ministério Público de Catanduva abriu inquérito para investigar as causas da epidemia de dengue. O promotor que conduz o caso, Carlos de Oliveira Otuski, informou ao UOL que o trabalho ainda está em fase inicial e aguarda respostas a ofícios enviados a órgãos públicos, entre eles o Ministério da Saúde. "Por cautela, não posso apresentar uma conclusão a respeito das causas até que a investigação seja concluída."
Fonte: Notícias Uol